Uma vez
Poesia de Nello Rangel / Aquarela de Annamélia
Desci rodando do penúltimo galho.
Não se vê nada assim.
Só um turbilhão.
Já adolescente fui arremessado longe
atropelado por um carro de polícia.
Rodopiei pelo ar demorados segundos antes do choque.
Dessa vez houve uma diferença.
Um powerpoint supersônico de imagens de minha vida,
em cronologia perfeita,
passou dentro de mim,
terminando com a imagem do carro chegando,
no exato momento em que batia no chão.
Isso foi diferente do mundo cinza rodopiante do
abacateiro.
Mas, de novo, não enxerguei nada no meio do redemoinho.
Só neblinas, fumaças em fluxo, girando, girando, até a
baque surdo.
O curioso é que, nas duas situações,
no instante em que ia esborrachar no chão,
eu me contorcia no ar.
E caia de ombro.
De alguma forma obscura eu, sem saber, sabia onde estava
o chão.
E, na hora certa, me virava.
Foi tão sério lá atrás que eu poderia, de verdade, ter
morrido.
E agora, de novo, tudo, tudo, ao redor, gira.
A vista, novamente, queda, enevoada.
Perdeu-se a rosa dos ventos?
No passado quase morri.
Mas nesse ano não morro.
Nello Rangel
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